quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Reivindicada pelas comunidades, Paraná adere a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Quilombola


Implementação da Política pode contribuir com desenvolvimento dos territórios tradicionais.  

O Estado do Paraná assinou, nesta segunda-feira (09), o termo de adesão à Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Quilombola (PNGTAQ). A assinatura aconteceu no Palácio das Araucárias, em Curitiba (PR) e foi acompanhada por integrantes de comunidades quilombolas, secretarias de estado, Superintendência Geral de Diálogo e Interação Social (Sudis), Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Federação Estadual das Comunidades Quilombolas do Paraná (Fecoqui) e a Terra de Direitos. 

Reivindicada pelas comunidades quilombolas do estado, a adesão à Política Nacional pelo estado é um importante instrumento para desenvolvimento dos territórios tradicionais. Lançada em novembro de 2023 e coordenada pelo Ministério da Igualdade Racial (MIR) e em colaboração com demais ministérios, estados e municípios, a PNGTAQ tem como objetivo implementar um conjunto de políticas - como geração de renda, saúde, agricultura, saneamento, entre outros - a partir do que a comunidade quilombola determina o que é importante para seu desenvolvimento e suas especificidades. Estados como Bahia, Maranhão, Piauí, Tocantins, Ceará e Rio Grande do Sul também aderiram à Política. 

"As comunidades quilombolas do Paraná têm um acesso parcial a serviços essenciais e políticas públicas. Ou esse acesso não ocorre ou é um serviço que precisa ser melhorado. Um exemplo é o saneamento. A adesão à esta política é importante pra mudar isso", destaca a integrante da Fecoqui, Rozilda Cardoso.  

Ela destaca ainda que a implementação da PNGTAQ pode contribuir para alterar o quadro de crise climática que afeta intensamente os territórios tradicionais no estado. De acordo com a liderança o avanço da monocultivos de pinus e eucalipto e a atuação de empresas têm acentuado o impacto sobre a biodiversidade. "Temos perda de rios, de espécies de plantas e animais, e consequentemente, afeta desenvolvimento para agricultura nas comunidades", relata. 

A adesão ao PNGTAQ foi feita pela Secretaria da Mulher, Igualdade Racial e Pessoa Idosa (Semipi), pasta que hospeda no estado a política para as comunidades quilombolas e o Conselho Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais. O próximo passo é a publicação da adesão no Diário Oficial e a constituição de um comitê estadual gestor de acompanhamento da implementação da Política. Segundo a secretária da Mulher, Igualdade Racial e Pessoa Idosa, Leandre Dal Ponte, a Secretaria deve em breve analisar a Política Nacional e, por meio de decreto, instituir um Comite Gestor para coordenar, monitorar, avaliar e acompanhar a execução da Política. "A PNGTAQ não pode ser só uma carta de intenções. A Política nos dá as diretrizes para ações para assegurar direitos das comunidades quilombolas", aponta a secretaria.  

A implementação da Política Nacional deve acontecer prioritariamente pela construção e desenvolvimento dos planos locais de gestão territorial e ambiental. Esses planos devem ser formulados, aprovados, geridos e monitorados pelas próprias comunidades quilombolas, conforme os usos, as dinâmicas, os costumes e as tradições de cada território.  

Os planos locais indicam as demandas das comunidades quilombolas, as áreas e assuntos mais frágeis e que exigem maior investimento (por exemplo, assistência técnica rural, logística para distribuição de alimentos, acesso a luz e água encanada). Saiba mais. 

Desenvolvimento de ações  
Para a Fecoqui a adesão pelo Paraná à Política Nacional é o compromisso público do estado com a implementação de políticas de desenvolvimento dos territórios que são de competência estadual, como por exemplo, medidas de acesso à educação pública, saneamento e voltados para a soberania alimentar das comunidades quilombolas.  

A ausência de título tem impactado acesso a políticas públicas pelos territórios tradicionais. Com 39 territórios quilombolas reconhecidos pelo Estado brasileiro, o estado do Paraná possui apenas uma comunidade quilombola com titulação, e ainda parcial. A finalização do longo processo de regularização fundiário de Paiol de Telha só foi possível com o acionamento da justiça, por meio de uma Ação Civil Pública (ACP), ajuizada em 2019 pela associação da comunidade. A comunidade ainda luta para titular a totalidade da área a quem tem direito.  

Ainda que a obtenção do título coletivo seja via de acesso à um conjunto de políticas públicas, é dever do estado garantir os direitos às comunidades, independentemente do estágio de titulação do território tradicional, aponta a Terra de Direitos. A organização assessora da Fecoqui na orientação sobre a Política Nacional 

Nesse sentido, o desenvolvimento da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Quilombola pelo Paraná pode "contribuir para desenvolvimento de políticas públicas específicas para cada território e para efetivação de diretos fundamentais orientados pelas demandas e vulnerabilidades de cada comunidade a partir de sua certificação, da posse e uso que a comunidade já faz de suas áreas tradicionais, dissociando da necessidade de se implementar políticas e garantir direitos somente após a regularização fundiária historicamente negada e com perspectivas para sua conclusão somente no ano de 4.732", destaca a assessora jurídica da Terra de Direitos, Kathleen Tiê. A assessora fez referência a levantamento da Terra de Direitos de que, caso mantido atual ritmo de titulação, o país levará 2.708 anos para titular todos os quilombos com processos abertos no Incra.  

O Governo do estado pode também contribuir para estimular e orientar a adesão à Política Nacional pelos municípios do Paraná. Ainda que seja uma Política Nacional, a execução da PNGTAQ possui maior relação direta com os entes públicos próximos à comunidade, como município e estado. São eles, em boa parte, que possuem a atribuição do desenvolvimento de políticas públicas essenciais, tais como educação e saúde, como explica a assessoria jurídica da Terra de Direitos.   

"O Estado pode incentivar a adesão dos municípios à PNGTAQ, a fim de que cada ente da federação se comprometa com os territórios quilombolas, e exerçam as atribuições que são de suas respectivas competências, em sinergia, para que as comunidades possam se desenvolver em escala, a partir das diretrizes estabelecidas para gestão de seus territórios", complementa ela. 

Prefeituras dos municípios de Reserva do Iguaçu, Doutor Ulysses e Adrianópolis manifestaram nos últimos meses o interesse em aderir à Política Nacional. Após envio de ofício à União, os municípios aguardam retorno do Ministério da Igualdade Racial. 

Previsão orçamentária 
Como envolve uma ação integrada entre as diferentes esferas de governo e de várias áreas, o orçamento para desenvolvimento das ações presentes nos planos locais das comunidades quilombolas podem ser oriundos de órgãos de todas as esferas públicas - da União, dos estados e dos municípios.   

Na esfera estadual o Paraná pode prever orçamento dirigido para a execução da Política Nacional na Lei Orçamentaria Anual, por exemplo. Em abril o Executivo estadual encaminhou o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025 à Assembleia Legislativa do Paraná. A proposta já foi aprovada pela Comissão de Orçamento, em julho, e segue para votação pelo Plenário nas próximas semanas.  

Ainda que o PLOA 2025 não preveja orçamento para execução do PNGTAQ, a secretaria da Mulher, Igualdade Racial e Pessoa Idosa aponta que é possível fazer inclusões na proposta. Segundo ela o Conselho de Povos Tradicionais deve iniciar um diagnóstico de demandas sobre situação das comunidades, e com isso, será possível visualizar áreas de atuação e de demandas. "À medida que a gente fizer todo os encaminhamentos com conselheiros [do Conselho] e representantes de comunidades tradicionais, a gente faz, se for necessário, alterações também e alguma revisão dentro da LOA", aponta. 

É possível também que o estado crie mecanismos de captação de recursos privados para financiamento da PNGTAQ, de acordo com regulamentação específica. Outra via é a aprovação de emendas parlamentares para destinação de recursos.

Fonte: Comissão Pastoral da Terra

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