Empresa implementa modelo agrícola que causa insegurança alimentar, escassez de água, desmatamento extremo, entre outros impactos.
Aachen, Berlim, 25 de abril de 2024
Às vésperas da assembleia de acionistas da empresa agroquímica alemã Bayer, uma coalizão de seis organizações sociais da Argentina, Brasil, Paraguai, Bolívia e Alemanha apresentaram, nesta quinta-feira (25), uma denúncia perante a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) contra a empresa.
Na denúncia as organizações responsabilizam a Bayer por sistemáticas violações dos direitos humanos à saúde, à alimentação, à água, ao meio ambiente, à habitação, à terra e/ou ao território e aos direitos dos povos indígenas e das comunidades camponesas devido ao uso de sementes geneticamente modificadas e agroquímicos à base de glifosato. A ação foi elaborada com base em extensas pesquisas e numerosas entrevistas com comunidades afetadas.
Na denúncia as organizações destaquem que a Bayer tem violado as diretrizes da OCDE para empresas multinacionais. A empresa promove na América do Sul, de acordo com a denúncia, um modelo agrícola que causa insegurança alimentar, escassez de água, desmatamento extremo, perda de biodiversidade, graves consequências para a saúde e conflitos por terras com comunidades indígenas e camponesas.
A denúncia perante a OCDE documenta quatro casos específicos que mostram os impactos negativos desse modelo agrícola em áreas onde a Bayer AG comercializa amplamente os seus produtos. Como parte da denúncia, o Centro de Estudios Legales y Sociales (Argentina), Terra de Direitos (Brasil), BASE-IS (Paraguai), Fundación TIERRA (Bolívia), Misereor e ECCHR exigem que a Bayer AG faça mudanças sustentáveis em suas práticas empresariais a fim de respeitar os direitos das comunidades locais e do meio ambiente.
""Essa denúncia tem um diferencial que é o caráter regional. Estamos apontando que não se trata de questões isoladas, ao contrário: decorrem do modelo do agronegócio na região, em que empresas estrangeiras lucram com o elevado uso de agrotóxicos, a despeito dos prejuízos causados à saúde e o meio ambiente. Há, ao mesmo tempo, uma dupla moral, em que estas empresas, como Bayer, falam publicamente que respeitam padrões de direitos humanos e respeito ao meio ambiente, mas na prática isso não ocorre. Assim, exigimos que mudem suas práticas e, também, apontamos a necessidade de avançar em normativas para responsabilizar empresas transnacionais por suas violações, sobretudo ao longo de toda cadeia produtiva. Isto é necessário sobretudo ao considerarmos o altíssimo uso de agrotóxicos pelos países da América Latina pelo agronegócio", destaca a assessora jurídica da Terra de Direitos, Daisy Ribeiro.
"A empresa não respondeu adequadamente aos graves riscos aos direitos humanos e ao meio ambiente diretamente relacionados ao seu modelo de negócios na região. Os impactos do uso de sementes geneticamente modificadas e pesticidas não foram monitorados, nem foram tomadas medidas adequadas para preveni-los e mitigá-los", afirma Sarah Schneider, especialista em agricultura e nutrição mundial da Misereor. Em média, mais de 50% das terras aráveis nestes países são destinadas à soja geneticamente modificada. A Bayer afirma ser líder latino-americana na comercialização de soja resistente ao glifosato e dos pesticidas à base dessa substância.
"Na denúncia mostramos que, devido ao avanço do cultivo da soja, em nossa região as pessoas sofrem intoxicações e doenças graves; há fontes locais de água tão contaminadas que não podem mais ser consumidas; as comunidades indígenas e camponesas são desapropriadas de seus territórios, afetando seus modos de vida e alimentação; desaparecem milhares de hectares de floresta, ameaçando animais e plantas locais", destaca o diretor da BASE-IS, Abel Areco.
Como plataforma de visibilidade internacional que pode ajudar a alcançar a responsabilização de empresas transnacionais, a OCDE, nas suas Diretrizes, estabelece recomendações sobre como as empresas multinacionais devem agir em questões como direitos humanos e meio ambiente
"As Diretrizes da OCDE são claras ao estabelecer deveres de devida diligência para a cadeia de valor a jusante, especialmente nos casos em que pode ser prevista a utilização indevida de um produto. Embora a lei alemã da cadeia de abastecimento na sua versão atual não inclua esta parte da cadeia de valor, a Bayer deve cumprir as Diretrizes da OCDE. Pedimos que para a soja transgênica e os pesticidas à base de glifosato, a Bayer desenvolva políticas de devida diligência baseadas no risco e que considerem o contexto da América Latina para contribuir para uma solução de longo prazo", afirma Silvia Rojas Castro, Assessora Jurídica do ECCHR.
Após o protocolo nesta quinta-feira, a OCDE dispõe agora de três meses para decidir sobre a admissibilidade da denúncia e assim apoiar a mediação entre as partes afetadas e a empresa. As organizações esperam que a Bayer responda à denúncia e participe ativamente na resolução dos problemas.
Poluição do povo indígena Avá-Guarani
No Brasil, a Bayer lidera o mercado de sementes geneticamente modificadas e pesticidas. Num cenário em que 95% da soja cultivada no Brasil é geneticamente modificada, as sementes Intacta foram utilizadas em 80% das plantações. Juntas, a Bayer-Monsanto representa 9 das 18 variedades de sementes geneticamente modificadas autorizadas para cultivo comercial, segundo Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio (2022). De 2010 a 2021, o uso de agrotóxicos no Brasil dobrou. São vendidos pelo menos 50 pesticidas proibidos na União Europeia. O glifosato é o ingrediente ativo mais vendido. Só em 2022, foram comercializadas 230.519 toneladas de Glifosato no país e 31.270 toneladas no Paraná.
O Paraná é o segundo estado produtor de soja do Brasil. Nos municípios de Guaíra e Terra Roxa o uso de agrotóxicos é predominante: 509 dos 661 estabelecimentos agropecuários de Guaíra e 921 dos 1.209 estabelecimentos agropecuários de Terra Roxa relataram uso de agrotóxicos. Nestes dois municípios, onde predominam o plantio de soja e milho, estão localizadas três aldeias indígenas, aldeias Avá-Guaraní. A relação entre indígenas e agricultores é tensa.
O uso intensivo de agrotóxicos contaminou rios, alimentos, animais e povos indígenas. Os pesticidas são até usados como arma química para confinar os povos indígenas a uma faixa de terra cada vez menor. Dependentes de rios e nascentes para acesso à água, as aldeias relatam doenças frequentes como vômitos, dores de cabeça, abortos espontâneos, dificuldade para respirar, entre outras, principalmente entre idosos e crianças. Relatam também o desaparecimento de espécies silvestres de pássaros, abelhas, borboletas, animais de caça e diminuição do número de peixes nos rios e perda da capacidade de produção de alimentos devido às águas e rios contaminados, gerando impactos na soberania alimentar dessas pessoas. Existem áreas fumigadas com agrotóxicos próximas às casas ou estradas indígenas. Em testes laboratoriais, foi verificada a presença do Glifosato e de seu principal metabólito, o ácido aminometilfosfônico (AMPA), em mananciais das aldeias (Y'Hovy, Pohã Renda e Ocoy).
"Os povos indígenas tem sido um dos povos tradicionais que mais sofrem com a contaminação sistemática da terra, alimentos, animais, pessoas e território pelo uso intenso dos agrotóxicos. Para estes povos ancestrais há ainda, de modo mais agravante, o uso de agrotóxicos pelo agronegócio como arma química para expulsão de indígenas de seus territórios", enfatiza Daisy.
Saiba mais sobre o modelo de negócios de soja da Bayer aqui.
*documento em alemão.
A denúncia perante a OCDE pode ser consultada aqui.
Fonte: Assessoria de comunicação - Terra de Direitos
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