por Jornal Brasil de Fato
.Jogando solto. Com os parlamentares liberados para pular as fogueiras de São João e boa parte das autoridades da República pulando o oceano para participar do convescote de Gilmar Mendes em Lisboa, finalmente, o Planalto desfrutou de uma semana de relativa tranquilidade. Sem ter que se preocupar com os poderes vizinhos, Lula recuperou a bola para pautar a agenda política e reforçar a artilharia contra o mercado financeiro. Durante toda a semana, bateu contra a tese da Faria Lima de que os ajustes fiscais via arrecadação já chegaram no limite - mesmo porque a renúncia fiscal do governo já alcança R$51 bilhões. Lula ainda insistiu que o governo pode sim aumentar impostos ou rever benefícios fiscais antes de falar em cortes de gastos, além de descartar a desvinculação das aposentadorias do salário mínimo. A negociação em curso no Senado para compensar a desoneração já vem nesta toada. A disposição de Lula para a briga é importante, porque ela vai ser longa e tem dois adversários duros pela frente, a Faria Lima e o Congresso. Na prática, as reformas do governo aumentaram significativamente a arrecadação, que alcançou R$ 202,98 bilhões em maio. Tanto o mercado financeiro, quanto os parlamentares querem o orçamento da União para si. Uma parte destes recursos já está sob controle do Congresso. Graças às emendas e ao Chantagista-Geral da República Arthur Lira, as bancadas parlamentares já decidem os destinos de mais recursos do que 14 ministérios. Já o mercado, subtrai o orçamento através dos juros estratosféricos - aqueles embasados na taxa Selic - pagos nos títulos públicos emitidos pelo governo e que somaram R$6,9 trilhões apenas em maio. Por isso, como alerta André Roncaglia, mais do que o fim da queda da Selic, a Faria Lima quer retomar o aumento da taxa e vai continuar chantageando o governo, aproveitando a conjuntura internacional e inflacionando o dólar com remessas para o exterior.
.Não vou acender agora. Depois que a bancada evangélica descobriu que a maiora da sociedade é contra o PL do estupro, inclusive os próprios evangélicos, a extrema-direta no Congresso teve que ir atrás de um plano B. E a descriminalização do porte de maconha aprovada pelo STF, depois de nove anos em julgamento, foi a oportunidade perfeita das hostes conservadoras de se manterem ativas e tentarem ofuscar o brilho do Supremo. É verdade que a postura passiva do governo em relação ao tema também contribuiu para que Arthur Lira e Rodrigo Pacheco se sentissem à vontade para afrontar o STF e acusá-lo de legislar no lugar do Congresso. Em resposta, Lira resolveu acelerar a tramitação da PEC das Drogas na Câmara, fazendo disso uma queda de braços para afirmar seu próprio poder. Apesar da disputa, a decisão do STF foi muito mais um marco simbólico contra o racismo, com o conhecido "tratamento diferenciado" das polícias em relação à classe e à cor dos usuários, do que uma mudança profunda da política antidrogas. A esperança é que a medida pelo menos alivie a superlotação nos presídios. Por isso, o assunto também tem relação com outras disputas que ocorrem na área de segurança pública, como a prioridade do governo em combater as milícias em contraste com a prioridade do Congresso em liberalizar a posse e o porte de armas. Trocando em miúdos, fazer segurança pública para os ricos ou para os pobres. E a próxima rusga entre o STF e o Congresso já tem data marcada. Enquanto Dias Toffoli pretende retomar a regulação das redes sociais em agosto, Arthur Lira usa qualquer desculpa para seguir queimando o PL das Fake News até a última ponta.
.Torre de babel. O eco da tentativa frustrada de golpe de Estado na Bolívia também traz preocupações ao governo brasileiro. Em primeiro lugar, porque colocou os golpistas daqui de prontidão, não para tentar algo parecido, mas sim para amenizar o que ocorreu em 8 de janeiro de 2023: "O STF e grande parte da imprensa brasileira entenderam a diferença de um golpe de Estado e uma baderna", afirmou nas redes o senador bolsonarista Rogério Marinho (PL-RN). Claro, uma das diferenças é que lá o líder golpista foi preso, enquanto o daqui segue solto… Mais importante é que o episódio reforça a onda de instabilidade que ronda a América Latina. Tudo isso dificulta o diálogo entre os países vizinhos, assim como a pretensão de atuar como bloco no cenário internacional. Além da mobilização popular, certamente a pronta resposta dos governos progressistas do continente e dos órgãos regionais, como a CELAC e a OEA, foi decisiva para o isolamento dos golpistas na Bolívia. O nível de improviso do aventureiro general Zíñiga também contribuiu para que nenhuma celebridade da direita latino-americana desse apoio aberto, sobrando para as subcelebridades bolsonaristas cantarem vitória antes da hora. O que não significa que o golpe não contou com apoio indireto, a começar pela encarregada de negócios dos Estados Unidos, Debra Havia, que já vinha conspirando contra o governo boliviano. Sem esquecer, é claro, os laços da família Bolsonaro com Jeanine Áñez, a opositora que continua presa por participação no golpe contra o ex-presidente Evo Morales em 2019. E por trás de tudo isso encontramos Elon Musk, que nunca escondeu sua ambição pelo lítio boliviano que está sendo explorado em parceria com a Rússia e a China. A tentativa de ruptura institucional no país andino deve ganhar destaque na Cúpula do Mercosul marcada para o início de julho e a única boa notícia é que ela talvez ajude a esvaziar o protagonismo de outro aventureiro de primeira viagem da extrema-direita latino-americana, o presidente argentino Javier Milei.
Fonte Jornal Brasil de Fato
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